Jornada de executivos tem alta com cenário instável
FELIPE GUTIERREZ
DE SÃO PAULO
Redução de 17% na criação de postos de trabalho e tensão no cenário econômico. A instabilidade que ronda o mercado hoje tem influência direta na agenda de executivos: jornadas mais extensas, segundo especialistas consultados pela Folha.
Em tempos de turbulência, as tarefas invadem os fins de semana, e os profissionais ficam até mais tarde no escritório, diz Betania Tanure, professora da PUC-MG (Pontifícia Universidade Católica).
Segundo o professor da FGV-SP (Fundação Getulio Vargas) Roberto Heloani, três fatores ajudam a esclarecer a ampliação dos horários.
Dois deles são medo de demissão -muitos estendem as horas propositalmente- e redução de pessoal. "É lógica aritmética: cortam-se postos, mas o trabalho não diminui.''
O terceiro é o tempo exigido para a tomada de decisões. É o que acontece com o analista Mário Saldanha, 34, da corretora Cedro.
Os mercados têm oscilado -e ele usa os fins de semana para manter-se informado.
O gerente de vendas da RGIS Alan Birck, 32, chegou a ter problemas de saúde por excesso de horas no trabalho.
Há três anos, assumiu uma gerência operacional e passou a trabalhar até 18 horas por dia -antes eram 12.
Neco Varella/Folhapress |
Alan Birck chegou a fazer jornadas de 18 horas |
Separou-se, teve gastrite e precisou se afastar por 15 dias. Na volta, mudou de setor e passou a gerir o tempo. "Sou mais produtivo, mesmo trabalhando oito horas", diz.
INSATISFAÇÃO DE MULHERES É MAIOR
Passa da meia-noite e Cynthia May Hobbs, 47, segue na análise de planilhas. O progresso na carreira da executiva deu-se na mesma proporção que as horas trabalhadas.
O maior salto na extensão da jornada foi quando deixou de ser gerente e virou diretora. Hoje, presidente da empresa de bebidas Sagatiba, estima dedicar à profissão mais de dez horas diárias.
Conjugar as exigências da companhia com as da maternidade é desafio. "Não desmerecendo o pai, mas o nível de responsabilidade da mãe é de outra magnitude."
Quando não consegue acompanhar os estudos do filho de 12 anos, Hobbs fica com "uma certa angústia". "É a cobrança que a mulher tem de estar presente", justifica.
Elas incomodam-se mais do que os homens quando a tarefa é combinar longas jornadas com vida familiar, de acordo com especialistas consultados pela Folha.
Luiza Sigulem/Folhapress |
Cynthia May Hobbs, 47, é presidente da Sagatiba |
Executivas sentem-se pressionadas a demonstrar que são qualificadas e tendem a sobrecarregar-se mais do que homens com tarefas, diz Ana Maria Rossi, da Isma (International Stress Management Association), associação de controle do estresse. "Muitas mulheres acreditam que precisam trabalhar o dobro para terem o mesmo reconhecimento", avalia.
Elas consideram as tarefas mais urgentes do que eles, indica Christian Barbosa, presidente da consultoria em produtividade Triad.
Para a professora Betania Tanure, da PUC-MG, por mais que as executivas tenham babás, julgam-se responsáveis pelas tarefas domésticas.
"Se uma mãe não vai à reunião da escola, sente-se culpada. Homens, quando vão, acham que estão fazendo o máximo", compara Tanure.
Avaliar que está em falta com os filhos e temer não dar conta das tarefas profissionais fazem parte da vida da economista Martha Barth dos Santos, 48. "Sou muito detalhista. Busco uma perfeição que não atinjo nunca."
A consultora de gestão Marisa Barbara, 46, também se divide entre maternidade e carreira e conta que, além de trabalhar longas horas, estuda com o filho. Passar a tarefa para o pai não é opção: "[Ele] não tem paciência".
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